O Mestre Descartes, após muito cogitar, encontrou uma espécie de " ovo de Colombo" quando resolveu iniciar na ordem cronológica, a sua Metafísica pela " res cogitans"; de facto esse recurso ao imaterial permitiu-lhe resolver satisfatoriamente um problema que no seu tempo, era candente. Hoje podemos transpor este problema, por analogia, para a relação que se estabelece entre o pensamento e a chamada"realidade virtual" e incluir nesta problemática a mediação que a torna possível, a da máquina; no entanto, esta mediação já não é nova, nem sequer em termos de tecnologias da comunicação , basta que nos lembremos que ainda o séc. XIX ia tenro quando Morse desenvolveu o telégrafo cuja linguagem era o célebre código que tem o seu nome e que permaneceu operacional até ao muito avançado séc. XX ( quem tem mais de 40 anos lembra-se, concerteza, da Marconi e dos seus boletineiros que entregavam telegramas). É óbvio que sem a intermediação da máquina tal não teria sido possível; a própria imprensa e também a rádio e a televisão só foram possíveis pela intermediação de máquinas mais ou menos sofisticadas, desde a tipografia fixa até à móvel, desde a telegrafia por cabo até à telegrafia sem fios, vulgo telefonia, aos vários avatares da televisão; tudo, para se constituir, implicou a mediação de máquinas. Áliás, o conceito de máquina remete mais para uma funcionalidade do que para uma complexidade, na verdade há até máquinas bem simples( uma alavanca, por exemplo).
O que se passa é que para além da real complexidade das máquinas hoje em dia utilizadas na informação e na comunicação, e essas não são de modo algum virtuais: as máquinas existem, estão lá, digamos assim, ocupam espaço, têm até, algumas, dimensões apreciáveis do ponto de vista físico e somente os seus efeitos possibilitam uma espécie de concretização do virtual. Não há, que eu saiba,efeitos virtuais produzidos por engenhos virtuais, o problema está antes, na dimensão e na utilização.
Com a acessibilidade e a portabilidade deu-se início a uma democratização do uso de instrumentos como o computador e o telefone móvel que até recentemente, não podiam ser utilizados com facilidade por toda a gente em qualquer lugar, e esta é que é a verdadeira revolução. A nossa maneira de pensar está há muito moldada por essa intermediação, trata-se agora do problema da utilização. Com efeito, a televisão tradicional, digamos assim, não é interactiva, e mesmo aquela que muitas vezes utiliza esse nome, não o é de facto, enquanto que a utilização da internet pode sê-lo mais facilmente , se bem que muitas vezes esta dimensão da interactividade se apresente de forma falaciosa: se eu tiver um blog blindado em que não sejam permitidos posts abertos, ela não é de facto interactiva, ou seja, na "democracia virtual", subsiste a questão do poder, do mesmo modo grosseiro que numa família quem manda na programação da TV é quem tem o comando na mão.
Este terreno presta-se geralmente a uma série de equívocos e ainda que não queiramos ser luddites, não podemos deixar de assinalar que há um certo discurso da " banha da cobra" tecnológica, que tende a apresentar-se como panaceia universal e que sofisticamente omite alguns pequenos pormenores dessa natureza - de que para enganar os tansos é melhor não falar; trata-se da velha táctica de " êpater le bourgeois"; é claro que como todos os discursos falaciosos ele não resiste a um mínimo de crítica e para citar em jeito de homenagem um outro Mestre recém-desaparecido e refiro-me a Baudrillard ( é claro que não é nenhum Descartes, mas os tempos também são outros): " A simulação já não é a simulação de um território, de um ser referencial, de uma substância. É a geração pelos modelos de um real sem origem nem realidade: hiper-real... O deserto do próprio real". ( in "Simulacros e Simulação").
Neste momento somos obrigados, por dever de lucidez, a ser uma espécie de Descartes ao contrário, e em vez de começarmos a nossa ordem das substâncias pela Substância insubstancial é melhor que quando acordamos, pela manhã, para os que o fazem, verifiquemos, pelo simples pôr dos pés no chão,( sim, não vale a pena dar cabeçadas nas paredes) se o mundo ainda existe e é claro que como existe, temos o imperativo de partir dele.
Post Scriptum: Claro que já há máquinas que pensam, no domínio da chamada Inteligência Artificial, mas não são estas que estamos a utilizar, apesar de estarem numa fase ainda embrionária, são só para aí 'n' vezes mais complexas.
O que se passa é que para além da real complexidade das máquinas hoje em dia utilizadas na informação e na comunicação, e essas não são de modo algum virtuais: as máquinas existem, estão lá, digamos assim, ocupam espaço, têm até, algumas, dimensões apreciáveis do ponto de vista físico e somente os seus efeitos possibilitam uma espécie de concretização do virtual. Não há, que eu saiba,efeitos virtuais produzidos por engenhos virtuais, o problema está antes, na dimensão e na utilização.
Com a acessibilidade e a portabilidade deu-se início a uma democratização do uso de instrumentos como o computador e o telefone móvel que até recentemente, não podiam ser utilizados com facilidade por toda a gente em qualquer lugar, e esta é que é a verdadeira revolução. A nossa maneira de pensar está há muito moldada por essa intermediação, trata-se agora do problema da utilização. Com efeito, a televisão tradicional, digamos assim, não é interactiva, e mesmo aquela que muitas vezes utiliza esse nome, não o é de facto, enquanto que a utilização da internet pode sê-lo mais facilmente , se bem que muitas vezes esta dimensão da interactividade se apresente de forma falaciosa: se eu tiver um blog blindado em que não sejam permitidos posts abertos, ela não é de facto interactiva, ou seja, na "democracia virtual", subsiste a questão do poder, do mesmo modo grosseiro que numa família quem manda na programação da TV é quem tem o comando na mão.
Este terreno presta-se geralmente a uma série de equívocos e ainda que não queiramos ser luddites, não podemos deixar de assinalar que há um certo discurso da " banha da cobra" tecnológica, que tende a apresentar-se como panaceia universal e que sofisticamente omite alguns pequenos pormenores dessa natureza - de que para enganar os tansos é melhor não falar; trata-se da velha táctica de " êpater le bourgeois"; é claro que como todos os discursos falaciosos ele não resiste a um mínimo de crítica e para citar em jeito de homenagem um outro Mestre recém-desaparecido e refiro-me a Baudrillard ( é claro que não é nenhum Descartes, mas os tempos também são outros): " A simulação já não é a simulação de um território, de um ser referencial, de uma substância. É a geração pelos modelos de um real sem origem nem realidade: hiper-real... O deserto do próprio real". ( in "Simulacros e Simulação").
Neste momento somos obrigados, por dever de lucidez, a ser uma espécie de Descartes ao contrário, e em vez de começarmos a nossa ordem das substâncias pela Substância insubstancial é melhor que quando acordamos, pela manhã, para os que o fazem, verifiquemos, pelo simples pôr dos pés no chão,( sim, não vale a pena dar cabeçadas nas paredes) se o mundo ainda existe e é claro que como existe, temos o imperativo de partir dele.
Post Scriptum: Claro que já há máquinas que pensam, no domínio da chamada Inteligência Artificial, mas não são estas que estamos a utilizar, apesar de estarem numa fase ainda embrionária, são só para aí 'n' vezes mais complexas.