domingo, 21 de junho de 2009

Galileu: uma ruptura epistemológica

A ciência moderna constituiu-se através de um processo lento como praticamente tudo na História que, no entanto, teve "picos" critícos. Um deles foi, sem dúvida, protagonizado pela obra e até pela vida de Galileu Galilei (Pisa, 1564 - Florença, 1642) e digo obra e vida, pois o incidente mor da vida de Galileu é também um marco na história da ciência e da luta pela liberdade de investigação e expressão pública do pensamento.
Galileu que foi matemático, físico e astrónomo e professor universitário desse conjunto de ciências que hoje estão "naturalmente" muito próximas, mas que então não o estavam assim tanto.
Ele foi um dos obreiros da "matematização do real" científico através da genial intuição, depois confirmada pelos factos, que "o grande livro da natureza está escrito em caracteres matemáticos".
A Física pré-galilaica era a de Aristóteles, portentosa doutrina que estabelecia uma simbiose entre uma metafísica totalmente especulativa e um "realismo" preso ao senso comum.
A pouco e pouco, por obra de brilhantes investigadores como o polaco Copérnico (1573-1543), o dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601) e o alemão Kepler (1571-1630), que passo a passo foram "desconstruindo", como agora se diz, o velho edifício que já vinha da Antiguidade Grega e postulava o Geocentrismo, o sistema aristotélico-ptolomaico, isto é, a convicção de que a Terra ocupava imóvel o centro do Cosmos, não do Universo, que é uma ideia mais recente.
O Cosmos era considerado um sistema concêntrico de esferas de cristal absolutamente fechado e com a Terra no centro e as estrelas como que coladas à última esfera.
Galileu adoptou o Heliocentrismo de Copérnico que considerava o inverso, que o Cosmos tinha o Sol por centro; ora, não sendo absolutamente verdadeira esta teoria aproxima-se muito mais da realidade como a ciência futuramente veio a confirmar.
Galileu opôs ao dogmatismo escolástico do aristotelismo medieval uma ciência de base matemática e experimentalista em que a suposição hipotética se vê confirmada pelos factos através da experimentação.
Esta posição e o ensino do movimento da Terra valeram-lhe a perseguição por parte da Igreja Católica então com um poder que ultrapassava largamente o meramente espiritual e dispunha de um instrumento repressivo, a Inquisição, que se encarregava de velar pela "ortodoxia" do que era ensinado, publicado e afirmado na sociedade europeia de então cujo monolitismo começava a abrir brechas. Lembremo-nos de Lutero (1483-1546) o monge alemão que "fundou" o protestantismo e abriu uma divisão definitiva na cristandade ocidental.
O "pecado" de Galileu foi, supostamente, ter contrariado a mensagem literal da Sagrada Escritura, que afirma a imobilidade da Terra e a mobildade do Sol, que é o que os sentidos captam.
Ora, acontece que a Bíblia é um livro religioso e não um livro científico, e que entre ciência e religião não tem que haver contradições se forem respeitadas as diferenças de abordagem do real entre uma e outra. Assim, nem a ciência deve ocupar-se de assuntos religiosos, nem a religião ensinar ciência. A Igreja e o papado assim não o quiseram entender e após várias admoestações, Galileu foi julgado por heresia e sob ameaça de pena de morte foi condenado a abjurar da sua profunda convicção científica acerca do movimento da Terra.
Ele já velho e cansado, não resistiu e proferiu perante o tribunal dos cardeais a fórmula da abjuração, mas terá dito entre dentes, " epuor si muove" ( e no entanto ela move-se!!!).
Escusado será dizer que dos cardeais que o julgaram, ninguém sabe o nome e de Galileu todos o sabemos!!!